Isa Eger é a jornalista mais publicitária que você vai conhecer. E vice-versa. Em poucos anos de carreira, coleciona prêmios como o ouro e prata no El Ojo, a Libertadores da propaganda. Atualmente é redatora na SoWhat, na capital paranaense.

Desde quando você gostava de escrever?
Desde sempre, eu acho. A primeira coisa que eu tenho de recordação minha e da minha mãe é ela me dando livro. E até hoje eu sei a história completa dos meus livros de infância, e o melhor de todos pra mim foi Poliana, e eu li inúmeras vezes. Eu sempre gostei de ler. E quando começou a ter redação na escola, minha professora falava que eu mandava bem nisso, eu fui me dedicando mais e, na hora de escolher faculdade, falei que era isso que eu queria, mas não sabia o que. Eu parei nas 3 opções: letras, jornalismo e publicidade. Apesar de não ter noção da redação dentro da publicidade, mas eu sabia que dava pra escrever com isso. Aí Letras é muita gramática, e acho que a gramática dá uma segurada na criação. Quando você se prende muito na gramática, você não consegue se soltar na criação. Fiquei entre jornalismo e publicidade, mas eu já conhecia publicidade, então fui pra jornalismo. E foi a melhor coisa que eu podia ter feito. Eu não me arrependo em nenhum momento. Hoje eu sei que quero trabalhar com publicidade, que é com o que eu trabalho, mas se eu fosse escolher de novo, eu continuaria escolhendo jornalismo.
No começo da sua carreira, quem te inspirava?
No começo eu não tinha nenhuma inspiração de publicidade, sendo bem honesta, porque eu não era apaixonada por publicidade, não curtia publicidade, os olhos ainda não brilhavam pra isso, e eu sempre gostei de me inspirar por quem tá perto. Quem tá longe eu conheço o trabalho, mas não conheço a pessoa, e uma coisa não pode ser desvinculada da outra. Então eu sempre gostei de me inspirar em quem está perto de mim, quem eu conheço como ser humano, quem eu sei que o trabalho que vende é igual às ideias que tem pro mundo. E nisso pra mim, quem me inspirou muito foram dois professores, eu tinha outras inspirações antes, mas que mesmo depois da faculdade eles seguem até hoje. O Paulo Camargo, que foi colunista na Gazeta por muito tempo, e agora ele criou o próprio site agora, que é A Escotilha, toda terça-feira ele posta uma crônica e toda terça-feira o que eu faço quando chego na agência, é abrir o site e ler a crônica dele. E ele me inspira por isso, o texto dele é incrível, a construção textual dele é impecável, e toda a análise que ele faz do mundo é o jeito que ele vê o mundo, e tudo o que ele escreve está de acordo com o que ele é. E eu tento levar isso pro meu trabalho também, o que eu fizer tem que ter a ver com o que eu prego. E a outra é a Lana Canepa que já era uma jornalista que eu gostava, no meio da faculdade ela me deu aula, ficou um tempo, viu que não era o rolê dela e voltou pro jornalismo, e a Lana me inspira de uma outra forma. Não só pelo trabalho, mas pela dedicação. Ela me inspira em como ela se dedica para as coisas, em como ela vê o crescimento da carreira dela, entender que às vezes ela precisa se mudar, ou que às vezes vai passar por situações que não é bem o que ela achava que ia passar, mas é isso que vai ajudar a chegar onde ela quer chegar e onde ela chegou. E ela é de Brasília, na verdade. E até hoje eu acompanho o trabalho deles, mesmo dentro do jornalismo e continuo me inspirando exatamente igual antes. E a Lana tinha um negócio muito legal que era o ensinar. Mesmo quando ela percebeu que dar aula não era a praia dela, ela continuava a pessoa que senta, dá dicas, acompanha nosso trabalho de longe, porque ela entende a importância de uma mulher que chegou longe, e o que ela tem de responsabilidade com quem ainda não chegou lá.

Paulo Camargo, professor e criador do A Escotilha.

Laura Canepa é professora e jornalista.

Qual é a primeira coisa que você faz quando pega um briefing?
Eu sempre leio o briefing bem por cima e vejo a percepção dele e faço uma frase resumo da primeira vez que eu li ele. Aí eu vou ler com mais atenção algumas vezes e ver se era aquilo mesmo. E se for aquilo mesmo eu sigo aquela minha primeira frase. Porque quer dizer que é a primeira coisa que me vem na cabeça, então é a primeira coisa que deve ser feita. Meu jeito de criar vem muito do jornalismo. Eu não gosto de criar direto do briefing, ler e já começar a pensar. Eu gosto de pesquisar e ler outras coisas, ler reportagens sobre o tema, vou conversar com pessoas que são têm relação com o assunto. Por exemplo, eu fiz o Com Você Eu Jogo Melhor, a primeira coisa, o planejamento fez uma apresentação maravilhosa, o briefing tava completinho, mas a primeira coisa que eu fiz quando li tudo e recebi o briefing foi mandar uma mensagem pra uma conhecida minha que joga bola e conversar com ela sobre futebol feminino. Eu mandei uma listinha de perguntas que ela mandou pro time de amigas em que joga e todas me responderam. Então a base inteira da campanha foi essa. Foi a visão de outras pessoas que estão ali mais do que eu. Li reportagem, vi documentários, eu tento ir muito mais pra fora do briefing. E depois eu reúno tudo isso, pra todos os jobs que eu faço eu tenho uma folha que é só a folha em branco, que eu vou jogando tudo de informação. Às vezes não vai me servir pra nada, mas às vezes vai ter uma fala de uma pessoa que deu entrevista no jornal, que vai ser o que vai fazer uma virada para o que eu preciso.

Projeto "Com Você Eu Jogo Melhor" para o Grupo Boticário. O objetivo era fazer do futebol feminino um assunto na boca do povo. 

 A gente está vivendo um momento de que a inovação e tecnologia estão fazendo parte  da propaganda. Você leva a inovação em consideração quando vai pensar em uma ideia? Ou não, é mais desformatado e se vier, veio.
Eu brinco que sou muito ruim em tecnologia, eu tenho um computador que comprei no primeiro ano de faculdade e não consegui colocar Word nele até hoje. E tenho ele há 6, 7 anos. Eu uso muito bem as coisas, mas não sei a parte técnica. Mas eu preciso saber. Porque a tecnologia está cada vez mais fazendo parte, então se chega uma campanha que a gente vê que tem muita tecnologia, a gente além de admirá-la, tem que saber como eu faria isso, olhar pra trás e saber qual é a técnica, assim como quando a gente olha pra trás de um bom texto e sabe qual a técnica usada ali, ou quando a gente olha pro layout e sabe o que ele tem de diferente. Porque a gente não olha para a tecnologia e entende como ela é feita. Por isso eu me obriguei a fazer no início desse ano um curso que tinha isso. Eu tinha 2h de aula com 2 caras que eram de tecnologia e foram parar na propaganda. Um deles trabalha na WMcCann e foi sensacional, de todos os cursos que eu fiz, foi o que mais prendeu a minha atenção, era tudo extremamente doido, o que eles mostravam, e eles davam dica de quanto aquilo poderia estar na propaganda. Como os óculos de realidade aumentada, não era só pro jogo, mas ele já é usado pra quem está no hospital. Isso porque a gente vê tecnologia como um artifício, e é muito menos um artifício, é muito mais uma forma de serviço. Por mais que eu não entenda muito sobre, eu tento ler bastante sobre o assunto.
Qual é a coisa que você mais gosta na sua pasta e por que? E se você pudesse mudar alguma coisa em algum projeto que você fez, o que seria e por que?
A coisa que eu mais gosto na minha pasta é o Com o Você eu Jogo melhor, mas não é por ser o que mais teve visibilidade ou o que me fez crescer muito rápido, mas é pelos bastidores. Porque eu acho que foi a campanha que eu consegui colocar tudo o que eu acredito como pessoa, como profissional de propaganda, como formada em jornalismo. Fiz muita pesquisa, não voltei pra casa várias noites, mas nenhuma delas foi exaustiva. Estava fazendo algo que eu acredito muito, com um discurso que eu defendo, não vai contra nada do que eu penso, e tem que ser feito. Precisa ser falado e, quando eu decidi entre o jornalismo e a propaganda, eu escolhi a propaganda, mas com a consciência de que eu queria trazer para a profissão o que eu tinha de essência do jornalismo, falar sobre o que precisa ser falado, mas falar de uma forma efetiva e fazer as pessoas refletirem sobre. E o Com Você eu Jogo Melhor foi o que eu mais consegui colocar tudo isso de fato na mesa, no job, questionar coisas dentro da agência, questionar muito o cliente. Foi muito difícil de sair o job em si, porque ele começou com algo muito pequeno, algo interno, e a gente levantou o debate que precisava ser maior, e por termos conseguido tornar isso maior, parar 153 empresas no Brasil, ter parado o maior concorrente, e no final do dia a gente olhar que outras coisas mudaram, como o número de inscrição de meninas nas escolinhas de futebol que esse ano tá muito maior, a gente entrevistou algumas professoras depois disso, algumas treinadoras de escolinha e  uma delas falou ‘grande parte é porque as escolas pararam’. E nessas 153 empresas têm escolas que pararam. Então a gente vê que, a longo prazo, isso vai fazer diferença. Pode ser que faça pra uma, duas pessoas, mas vai fazer diferença. E se eu pudesse mudar da minha pasta alguma coisa, eu acho que comecei a olhar pra minha pasta de uma maneira diferente, a gente tá numa era muito da ideia, onde as ideias vão além da propaganda, e aí eu me foquei muito nisso na minha pasta, e quando eu olho pra ela, eu vejo que falta uma coisa que é o escrever. O escrever pelo gostar de escrever mesmo, não só o título legal. Se é um manifesto, um long copy, acho que daqui pra frente eu vou trazer muito mais pros meus jobs. Não só porque o mercado quer bons textos, mas porque os bons textos fazem parte do que eu sempre gostei de fazer. E nessa onda de ideia, eles ficaram um pouco pra trás e não poderiam.

Videocase que explica a ideia Com Você Eu Jogo Melhor.

Quais campanhas você acha mais legal na propaganda mundial? Quem te inspira hoje em dia?
Tem uma campanha que mudou o meu modo de ver o que eu quero fazer da vida. Eu estava no Festival do Clube de Criação do Paraná, de 2017 e o Bernardo Romero era um dos palestrantes. Em 2017 era o momento em que eu estava completamente apaixonada por propaganda, sabendo que eu queria isso, mas eu tava vendo muita gente na família falar “você é formada em jornalismo, e você precisa atuar como jornalista”. A gente estava começando num momento de debate político e eu sou apaixonada por jornalismo político e eu estava tentada a largar a publicidade pra voltar pro jornalismo político. E, naquela noite, vendo a palestra do Bernardo, ele mostrou alguns cases dele. E um dos cases era o otoscópio que fala com as meninas que podem ter sofrido abuso. Eu vi aquilo e eu pensei “posso fazer a diferença na vida de alguém com propaganda”. E ali que eu percebi: tem como conciliar o que eu acredito como ser humano, o que aprendi naquela faculdade, com o que eu gosto de trabalhar, com o que eu quero trabalhar. E dali pra frente eu me tornei outra publicitária, apesar de terem outras campanhas maravilhosas dele e de outras pessoas, mas a dele, mudou tudo.

Bernardo Romero é EVP e ECD de Healthcare e Wellness do grupo Grey.

A ideia citada por Isabella não tem videocase disponível online.

Projeto supervisionado por Bernardo Romero na Grey para ADIABC, do Brasil

Outro projeto de Bernardo Romero. Na época, estava na Area 23.

E quem te inspira atualmente?
Por mais que eu tenha citado o Paulo lá no início, quando eu comecei a conviver mais com agência, ver a realidade de agência, eu percebi que completamente a gente fala de inspirações masculinas e não de mulheres. E quando eu fiz o curso de criação, eu ouvi falar de uma mulher o meu curso inteiro, duas na verdade. E só. E todos os exemplos eram homens, todas as pessoas que a gente tinha que ver a pasta eram homens e eu defini que, quando eu fosse falar sobre isso pra qualquer pessoa, eu ia falar de mulheres. A gente precisa falar sobre elas pra que elas se tornem conhecidas, por mais que as que eu gosto já sejam. 
Em carreira, sem dúvidas, Joanna Monteiro. Acho que tudo o que ela fez desde o início, como construção de carreira pra chegar onde ela está agora, é incrível, quando ela se tornou CCO eu fiquei extremamente emocionada e eu nunca troquei uma palavra com ela. Não é uma pessoa que eu convivo, não é uma pessoa que eu vi batalhando, mas é uma pessoa que como mulher eu vi chegando lá e chegou lá porque merece. A Keka também, por mais que sejam duas que a gente lembra facilmente, mas a Keka está vindo mais pra esse discurso mulher e questionando tudo o que a gente vive em agência, assumindo papéis que ela não precisaria assumir, porque ela já está lá, ela já conquistou o que ela tem, mas ela tá assumindo e eu acho isso incrível. Em questão de texto, eu gosto muito da Sophie Schonburg.
Eu pedi uma lista de pessoas que eu precisava ver a pasta pra um colega redator assim que eu decidi que tava começando a gostar de publicidade. Ele virou pra mim e falou que ia mandar uma lista de mulheres. E eu lembro que a Sophie foi a que me impressionei, adorei o que ela faz. E quando eu penso em alguém mais novo, mais próximo da minha realidade, é a Julia Velo, de SP, que está na JWT, porque eu acho que ela é exatamente o que eu quero ser. Porque tudo o que ela faz tem o propósito dela ali no meio, ela vai além da propaganda, usa o Instagram como maneira de questionar muita coisa, e dedica tanto tempo a isso quanto ela dedica pra uma campanha. E e ela traz tudo isso para as campanhas dela. Então se ela faz uma campanha falando de câncer de mama, ela traz só mulheres fazendo a campanha, em todas as fases não teve um homem tocando, e eu acho isso lindo. E o texto dela é muito lindo.

Joanna Monteiro é responsável pelos Projetos Globais da FCB Global.

Nivea Doll é um projeto criado pela FCB Brasil, quando Joanna desempenhava a função de ECD

Speaking Exchange para CNA: outro premiado projeto feito pela FCB Brasil enquanto Joanna era ECD da agência.

Keka Morelle, atual CCO da Wunderman Thompson.

Projeto premiado em Cannes para Guaraná Antarctica e supervisionado por Keka Morelle.

Projeto para Havaianas pela AlmapBBDO e supervisionado por Keka Morelle.

Print feito por Keka Morelle na F/Nazca S&S, em 2007.

Filme para Havaianas

Filme para Getty Images

Júlia Velo, redatora da JWT.

FanFeat para Coca-Cola

Filme de Júlia Velo para Avon.

Júlia Velo para Coca-Cola

Uma dica pra quem tá começando?
Vai ler. Abre um livro agora e começa a ler. Qualquer livro. Seja de publicidade, que vai te inspirar a trabalhar com isso, seja um livro de ficção, de não-ficção, mas acho que quando você começa a entender o que você gosta de ler, você começa a entender o que gosta de escrever também, como construir seu texto. E aí, quando você constrói um bom texto, mesmo que a campanha inteira não tenha uma palavra, você entende muito melhor. Então acho que você encontrar a sua forma de escrever é a chave, e ela não precisa ser a mesma sempre. Assim como a gente muda de pensamento, assim como a gente vê muita mudança de design, a onda de D.A, como a onda F/Nazca, texto também tem essa onda toda, e a gente também tem essa onda interna. Então tem momento que a gente escreve muito de um jeito porque é inspirado por algumas pessoas ou por coisas no mundo que estejam acontecendo, e momentos que a gente vai escrever de outra. Mas você precisa ler pra encontrar os seus momentos e a sua forma.

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